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DIREITO EDUCACIONAL? QUAL SUA IMPORTÂNCIA?

  • Foto do escritor: Comunicação OAB-MG Subseção Juiz de Fora
    Comunicação OAB-MG Subseção Juiz de Fora
  • 13 de mai.
  • 15 min de leitura

I – DO NOME DIREITO EDUCACIONAL

O Direito, como ciência, é uma instituição antiquíssima, pois o ser humano, como ser social, tem a necessidade de estar em permanente contato e convivência com o outro e, dada a diferença natural e intrínseca que há entre as pessoas, os atritos sempre existiram e existirão, sendo necessária a busca de soluções para as divergências, contendas, opiniões e lides havidas entre seres humanos. Em decorrência disso, quando o Homem passou a organizar-se em grupos, as contrariedades e discordâncias passaram a exigir maiores raciocínios e, também, necessitou de alguém que pudesse orientar a busca de soluções, que fugissem ao arbítrio de um rei ou de alguém parcial, necessitando que se embasasse a solução na razão, nas provas, no direito e, não, na força, muito menos no simples “olho por olho, dente por dente”. Consequentemente, a convivência humana passou a exigir regras, evoluindo para leis escritas a fim de normalizar condutas e concretizar direitos, garantindo paz e justiça a todos. Isso, logicamente, não foi fácil. Os tempos foram se passando, as organizações sociais foram crescendo, se modificando, o número de pessoas integrantes dos grupos aumentava e a realidade e os interesses iam contribuindo para que, cada vez mais, inúmeros outros problemas e opiniões surgissem gerando conflitos maiores, tanto em número quanto em interesses divergentes, causando a necessidade de se buscar e melhorar argumentos que sedimentassem as novas soluções e novos meios que as amparassem e que resultassem na paz social. Necessário inferir que isso não mudou. Hoje, estamos vivendo no 3º Milênio e o Direito continua a ser uma ciência em evolução, em constante busca de aprimoramento e, pelo seu dinamismo inconteste, vai se aperfeiçoando e exigindo do ser humano e, principalmente de seus operadores, uma atualização constante, ininterrupta e exigente. Daí encontrarmos a necessidade de

1 Mestra em Direito, pós-graduada em MBA em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, em Direito Penal e Direito Processual Penal, em Psicopedagogia e em Língua Portuguesa; graduada em Direito, em Letras e em Pedagogia; fez o curso Solução Pacífica de Conflitos no âmbito da Administração Pública, pela Escola da Advocacia-Geral da União Ministro Victor Nunes Leal. Autora do livro O Egresso do Sistema Prisional no Brasil (2004); coautora do artigo Os efeitos da crise sobre a Educação e Reflexões sobre o Ensino Remoto (2021); coautora dos livros Filosofia do Direito e o Tempo (2011), O Direito à Arte (2012) e Direito e Pessoa (2013). Membro da Comissão da OABJF Direito na Escola. Professora, Advogada.

especialização, surgindo ramos diferenciados, apesar de interligados, mas que abarquem a melhor defesa às partes e a melhor solução a quem busca amparo nos órgãos competentes, os denominados tribunais, com sua também larga diferenciação e sedimentação jurídica. Há os Tribunais integrantes do Poder Judiciário2, com suas diferentes Instâncias, Tribunais nacionais e Internacionais3, que também contribuem para o alcance da paz social no mundo, por exemplo: 1) A Justiça da Infância e da Juventude tem competência absoluta para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores em creches ou escolas, nos termos dos arts. 148, IV, e 209 da Lei n. 8.069/1990 (Tese julgada sob o rito do art. 1.036 do CPC/2015 - TEMA 1.058). Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?b=ACOR&O=RR&p=true&livre =%28%28justic%24+ou+juizo%24+ou+vara%24%29+com+%28infancia+ou+juventude%29+com+compet%24+com+%28matr%EDcula+ou+registr%24+ou+inscr%24%29+com+%28creche%24+ou+escola%24+ou+colegio%24+ou+institu%24+adj3+ensino%24%29%29+ou+tema+adj2+%281058%24+ou+1.058%29

Em decorrência da necessidade humana de convivência constante com seus pares, essas trocas, com o passar do tempo, vêm sendo cada vez mais alargadas, intensificadas, diversificadas. A par disso, tudo foi, por um lado, facilitado pelos meios eletrônicos que diminuíram espaços, aproximaram pessoas, ganharam tempo, mas, por outro lado, criaram um alcance imenso a opiniões tão diferentes, complexas, embasadas em argumentos tão próprios e com defesas tão intensas quanto inóspitas, dada a rapidez de sua divulgação e exigência de respostas imediatas. Os meios eletrônicos ao alcance do ser humano tanto é uma bênção, um alívio, uma economia de tempo e de dinheiro, quanto é, também, um problema imenso em busca de soluções. O Direito contribui, sim, para equilibrar forças, encontrar novas soluções, criar novos espaços para discussão, divulgar opiniões, descobrir diferentes mecanismos de defesa, além de incrementar a atuação jurídica, em amparo à busca de satisfação pessoal. Contribui, também, para que novos direitos surjam e, consequentemente, novas leis, novos meios de defesa, novos argumentos, novas decisões, novas formas de aplicação de normas apaziguadoras, novos métodos e técnicas para a concretização da justiça etc.

2 Disponível em: https://www.cnj.jus.br/poder-judiciario/tribunais/ Acesso: 27/04/2025.

3 Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://funag.gov.br/loja

/download/1018-tribunais-internacionais-contemporaneos.pdf. Acesso: 27/04/2025.

Nos seus primórdios, o Direito não se fundava em leis propriamente ditas, mas, nos costumes, além de, também, em todo um universo de acontecimentos ocorridos nas diversas etapas temporais, o que é comprovado no inconteste dinamismo do Direito:

A História do Direito surge como uma disciplina fundamental porque ela vai descrever, revelar e contar todos os acontecimentos ocorridos em uma determinada época e em um determinado local e o seu processo de evolução. Para isso, ou seja, para estudar a história do direito de várias civilizações, faz-se necessário o estudo dos institutos jurídicos, a exemplo do casamento, da propriedade, do direito penal etc, e também das suas fontes do direito, isto é, tudo aquilo que pode ter ocasionado a criação de um direito.4

O Direito, primordialmente, era somente Direito. Com o tempo, passou a necessitar de especializações, sendo desenvolvidos diversos ramos, conforme as exigências, os aprimoramentos, as necessidades, os problemas e, logicamente, os temas que os abarcava. Assim, sugiram, o Direito Constitucional, Civil, Processo Civil, Penal, Processo Penal, Administrativo, Previdenciário, Trabalhista, Internacional etc. Na segunda metade do séc. XX, passamos a conviver com vários outros novos ramos e, tanto, que nem conseguimos, ainda, assegurar, com certeza total, se são ramos novos ou não, dada as divergências de opiniões dos diversos estudiosos, como ocorre com o Direito Educacional e como se poderá observar nesta breve dissertação.

Certo é que hoje lidamos com o direito Médico, o Direito Ambiental, Direito do Consumidor, dentre outros, mas, aqui, impõe-nos discorrer sobre um dos mais recentes que é o Direito Educacional.

Estes aspectos da ciência do Direito são dados apresentados apenas como abertura desse tema relativamente novo, mas que é, concomitantemente, muito antigo e inóspito, incorrendo em uma interface entre Direito e Educação e, aqui, faremos uma breve inserção num dos que é um dos mais, senão o mais, novo ramo do Direito a merecer estudo aprofundado, especialização e discussão, considerando a necessidade e a amplitude de suas causas, seus envolvimentos, suas interligações com os diversos temas e ramos do Direito, notadamente, os direitos e deveres de crianças, adolescentes, estudantes de todos as idades, etapas e níveis, bem como de todos os profissionais,

4 Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-historia-do-direito-como-disciplina-fundamental/446107751 Acesso: 27/04/2025.

familiares, entes públicos e particulares envolvidos, direta e/ou indiretamente, nesta relação. Esse tema interessante, altamente relevante, muitas vezes, inóspito, será, aqui, apresentado de maneira breve, simples, porém, tem objetivo claro: trazer o tema à discussão de todos os envolvidos na defesa da Educação.

1.1

- DIREITO E EDUCAÇÃO: uma interface necessária:

Há quem entenda que Direito Educacional e Direito à Educação “são expressões que se equivalem”, conforme assegura Nelson JOAQUIM5, um dos maiores nomes neste assunto, que, ao tratar do surgimento do Direito Educacional, afirma que este pode ser considerado por três perspectivas diferentes: a primeira, seria em “1549, com a chegada dos Jesuítas ao Brasil,” a segunda, ocorre com a “promulgação da Constituição Federal de 1934” e a terceira “surgiu no 1º seminário de Direito Educacional realizado na Universidade Estadual de Campinas (NUCAMP), em 1977”6. Não nos aprofundaremos nesta discussão, que será feita, oportunamente. Cumpre-nos, por ora, aclarar, sobre a nomenclatura: Direito da Educação, ou, Direito à Educação, ou Direito Público Subjetivos à Educação ou, ainda, Direito Educacional?

1.1-1 - Fácil observar que o nome, Direito da Educação encaixa-se à ideia de pertencimento, de posse, apesar de esta preposição (de) ter diversos significados, conforme o termo a que se liga, apresentando também os sentidos de origem, posse, instrumento, assunto, conteúdo, dentre outros. Isso alarga o sentido e dificulta entender a expressão “Direito da Educação”, impresso no substantivo comum “educação” que, etimologicamente, conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira:

deriva do latim educatione. 1-Ato ou efeito de educar(se). 2. Processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano. 3- Civilidade, polidez. 4- Nível de ensino7.

Humildemente penso, com base no que se depreende do significado da palavra educação, não seria o nome “Direito da Educação” uma clara e definidora denominação para esse “novo” ramo da ciência do Direito. A Educação, sim, é um processo de educar,

5 Os desafios do direito Educacional no ensino, gestão educacional e nos tribunais. Revista Digital do IAB, Rio de Janeiro, v. 42, p. 1-13, março – junho 2020. IAAN 2175-2176. Disponível em: https://digital.iabnacional.org.br. Acesso: 15/04/2025.

6 Idem.

7 Mini Aurélio: o dicionário da Língua Portuguesa. FERREIRA, Marinha Baird (coord). 8 ed. rev. atual. Curitiba: Positivo, 2010.

a si e ao outro, apesar de nós, seres humanos, estarmos sempre negligenciando o fato de que nos educamos a nós mesmos e isso engloba todos os aspectos do ser humano, de forma indelével e profundamente, ao longo de toda a vida. Concomitantemente, somos educados por nossos pares, com a convivência, a troca natural no tempo e no espaço que ocupamos vivencialmente.

1.1-2 - A nomenclatura Direito à Educação leva ao raciocínio de ir a algum lugar (direito de ir para a educação, alcançá-la, tê-la à nossa disposição). Isso nos leva a pensar que pode ser comungado por todos, que esse direito é o de receber educação, de todas as formas possíveis, ou seja, além da família, também do Estado, igrejas, clubes e de todas as instituições às quais nos inserimos frequentemos ou a elas estejamos ligados. Entendo, com simplicidade, que não há erro nesse raciocínio, mas há limites.

1.1-3 - Direito Público Subjetivos à Educação é um nome pomposo. Mas o que é um direito Público Subjetivo? É um direito próprio do indivíduo que pode ser defendido perante o Estado, pois é o Estado um dos responsáveis pelo direito à educação e deve assegurá-lo, cabendo à parte cobrar, no momento, na forma e lei adequadas, à sua concretização. Porém, a Educação não é responsabilidade somente do Estado e a Constituição Federal, em seu art. 6º, assegura que: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Observa-se que a educação é, antes de tudo, um direito social, ou seja, além da educação, todos, indistintamente, têm assegurados pelo Estado, direito de uma vida com dignidade e, para que se tenha dignidade, necessário ter também, trabalho, alimentação, saúde, moradia etc., o que configura cidadania e, para isso, há o art. 205, da CF/88, em seu caput, afirma e sedimenta que: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (G.n.) A educação é direito de todos, mas quem são “todos”? São crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, enfim, são os seres Humanos. Além disso, neste mesmo artigo constitucional, está indubitável que o direito social à Educação também é direito e dever

da família, da sociedade e do Estado. É possível, ainda, acrescentar, sem margem de erro, que tal direito é, ao mesmo tempo, um dever que se alarga à toda a sociedade, mormente haver leis que obrigam os indivíduos a se inserirem em determinados comportamentos, conforme as leis adequadas e que são pertinentes ao lugar em que ocorrem, contra quem são praticados e inúmeras outras particularidades inerentes ao Direito como ciência. Por exemplo, na LDB (Lei nº 9394/96), no art. 1º Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho; no Código Penal, o art. 246 imprime uma proibição: “Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa”; no Código Civil, art. 1ª, “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.”; no ECA, no art. Art. 1º “Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente” e em inúmeros artigos e outras normas legais ramos d Direito há relação com o amparo, direto ou indireto, ao direito e/ou à Educação, à responsabilidade dos pais e ou responsáveis, do Estado, da sociedade. Mais que isso, é importante asseverar que diuturnamente, surgem leis que protegem ou impõem comportamentos positivos ou negativos às pessoas, de modo a assegurar-lhes usufruir de direitos e de cumprir deveres, por exemplo, a Lei nº 14.811/2024, que no Art. 1º diz que:

“ Esta Lei institui medidas de proteção à criança e ao adolescente contra a violência nos estabelecimentos educacionais ou similares, prevê a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente e altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e as Leis nºs 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos), e 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). (G.n.) Observa-se que, resumidamente, este artigo legal, de forma direta, faz um intercâmbio indiscutível e necessário com vários ramos do Direito. Vê-se que essa nomenclatura é generalizadora. Cabe salientar que condutas que resultem em ofensas ao estudante, ou a profissionais da Educação, direta ou indiretamente, por quaisquer meios, têm provocado a judicialização da Educação, necessitando, portanto, da especialização do operador do Direito, sedimentando as bases desse novo ramo, que entendo ser Direito Educacional. 1.1-4 – Direito Educacional - A palavra educacional é derivada do substantivo educação, acrescida do sufixo “al”. De forma simplificada, o substantivo “educação” é um nome também

derivado do verbo educar, do latim educare, que, segundo HOLANDA FERREIRA8, significa “promover o desenvolvimento da capacidade intelectual, moral e física (de alguém) ou de si mesmo; instruir-se”. O sufixo “AL”, conforme ensinamento de BECHARA, 2010)9, é utilizado para formar adjetivo e significa abundância, aglomeração, coleção. Desta linha de raciocínio, torna-se claro o entendimento de que a nomenclatura Direito Educacional é a melhor opção, tendo em vista que esse novo ramo do Direito tem relação com diversos outros ramos já estabilizados, nos diversos códigos nacionais. Sendo assim, será com essa nomenclatura e é dessa forma que o trataremos aqui. II – DA IMPORTÂNCIA DO DIREITO EDUCACIONAL A interface entre o Direito Educacional com as diversas áreas do Direito é uma relação necessária e comprovada, como acima, simplificadamente, foi exposto. Portanto não se paira nenhuma dúvida de que esse tem plena e ilimitada relação com quase todos, senão todos, os ramos do Direito, considerando que a própria Constituição Federal/1988 impõe que a Educação é direito e dever de todos, indistintamente, conforme se tem no caput do art. 5º, in verbis: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: É inquestionável que o termo “todos” vai muito mais além do que se exemplifica no artigo acima colacionado. É bem verdade que na enumeração dos direitos não está expressa a palavra “educação”, porém a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a tratar o tema como um direito inalienável e inquestionável, intransferível, irrenunciável, fundamental, já que afirma no art. 6º, já mencionado, que a Educação é um direito social. Mas o que é um direito social constitucionalmente protegido? Até onde vai essa proteção? De que forma ela ocorrerá? Há inúmeros questionamentos e o presente trabalho, apesar de ser tema terminantemente relevante, não se adentrará neles, reconhece que merecem e suscitam grande aprofundamento, porém, nestas linhas, apenas abre um chamamento, um convite à discussão deste tema. O objetivo aqui é simplesmente demonstrar que o Direito Educacional tem importância que ultrapassa todos os limites dos diversos ramos do Direito e todas as barreiras territoriais, até por meio de intercâmbios e porque já é tratado, em muitos países, como uma ciência. Também no Brasil o é, necessitando, apenas, ser reconhecido por todos, considerado, tratado e estudado como tal. Na r. decisão abaixo colacionada, a título exemplificativo, pode-se depreender quantos ramos

8 Idem, p. 271.

9 BECHARA, Evanildo. GRAMÁTICA ESCOLAR DA LINGUA PORTUGUESA. 1ª ed. 6ª impressão – Rio de Janeiro: Lucerna, 2006, p. 517.

do Direito estão direta e/ou indiretamente ligados numa ocorrência escolar, quando um aluno é agredido por outro aluno/colega dentro da escola: Trecho da ementa "(...) 2. Os estabelecimentos de ensino particular têm o dever de guarda e vigilância em relação aos alunos que lhes são confiados, a atrair sua responsabilidade civil objetiva pelos danos ocorridos com os estudantes em suas dependências, a não ser que, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, o qual norteia a relação existente entre as partes, se prove a inexistência de defeito na prestação do serviço ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, circunstâncias não evidenciadas no caso concreto, assim como não evidenciada a culpa concorrente da vítima, capaz de minorar o grau de responsabilidade do ofensor, não se desincumbido o réu do ônus processual que lhe competia. 3. Tem-se por configurado o dever do estabelecimento de ensino em indenizar o aluno pelos danos materiais, morais e estéticos sofridos em razão da cegueira parcial que lhe acometeu após agressão perpetrada por colega de classe, enquanto estava sob a guarda e autoridade do colégio, em vista da ineficiência dos primeiros socorros que foram prestados ao menor após a ocorrência do acidente, bem como do não encaminhamento imediato do estudante a atendimento médico pertinente, a evidenciar omissão da instituição de ensino quanto ao dever de cuidado e, por conseguinte, falha na prestação dos serviços que lhe competiam." (G.n.) Acórdão 1309633, 00203543420158070007, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Sétima Turma Cível, data de julgamento: 9/12/2020, publicado no DJE: 25/1/202110

No caso acima, bem se vê que não se tem apenas, o Código de Defesa do Consumidor citado a amparar a lide. As partes envolvidas, instituição de ensino (alunos, diretores, professores, coordenadores, orientadores etc.), as famílias, o Estado, os profissionais procurados para atendimento, dentre outros. Todos estão, direta ou indiretamente, envolvidos no problema e precisam, sim, conhecer seus direitos e seus correspondentes deveres, a fim de solucionar a lide. Logicamente, o ideal seria que tal problema não houvesse acontecido, dada a sua consequência terrível (cegueira de um aluno). Certamente, se os profissionais da instituição escolar, a família e os alunos tivessem sido orientados quanto às suas responsabilidades (direitos e deveres), talvez, um incidente tão sério não tivesse ocorrido. Ou suas consequências não chegassem a causar um dano tão sério, lamentável e irremediável, quanto o foi. O Direito Educacional tem, obrigatoriamente, como parte (autora ou ré), em qualquer processo pertinente, professores, diretores, pais, responsáveis, alunos (inclusive de ensino

10 Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/dano-moral-no-tjdft/educacao/dano-a-integridade-fisica-ou-mental-de-aluno-em-escola-particular. Acesso: 28/04/2025.

superior), instituições de ensino (particulares, municipais, estaduais, federais e até internacionais), pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, assistentes sociais, trabalhadores terceirizados em ambientes escolares (merendeiras, cozinheiras, faxineiras, comerciantes, editoras etc.). Enfim, toda e qualquer pessoa – física ou jurídica - ligada direta ou indiretamente a problemas relacionados ao aluno/escola/educação. Não há como fugir disso. Mas como tratar desse tema, sem considerá-lo um novo ramo do Direito? Uma das muitas respostas a esta questão é a apresentada pela Professora Dra. Adriana A. Dragone SILVEIRA11:

“Os direitos educacionais estão amplamente garantidos na legislação brasileira (CUrY, 1998; ranieri, 2009); a educação é o direito social mais reforçado em termos de proteção judicial (dUarTe, 2003), no entanto há um caminho longo a se percorrer para a plena satisfação desses direitos”12. (G.n.)

É inconteste que só crescem os inúmeros problemas que ocorrem dentro dos ambientes escolares, diretamente ligados aos atores educacionais, por exemplo, há agressões físicas, entre aluno e aluno, alunos e professores, dirigentes arbitrários, pais e/ou responsáveis agressores aos professores e à direção; problemas relativos aos contratos mal elaborados pelas instituições de ensino; negativa de entrega de documento e/ou cobranças indevidas para a entregá-los, ou exigências de aquisição de material escolar, exclusivamente, na escola, por preços, muitas vezes, abusivos; direitos laborais descumpridos. Enfim, há tantos exemplos ruins que a judicialização da Educação já é tema corrente, como abordado por muitos profissionais do direito. O Min. Og Fernandes, do STJ, entende que “... não é mera coincidência que a educação seja o primeiro direito social fundamental citado no artigo 6º da Constituição”: . "Não há exercício da cidadania sem a formação educacional, e não há educação efetiva sem a preparação das pessoas para defenderem seus direitos e cumprirem com seus deveres. Educação e cidadania são pautas interseccionadas na nossa Constituição e devem ser objeto de defesa permanente por governantes, pela sociedade civil e pelo Judiciário" 13 (G.n.)

11 SILVEIRA, Adriana A. Dragone. Doutora em Educação. Professora Associação de Escolas Reunidas – Rio Claro. E-mail: adrianadragone@yahoo.com.br

12 Disponível em: JORNAL DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS. N° 9 | JANEIRO-JUNhO DE 2011 | PP. 30–40.

13 Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/12112023-Educacao-e-cidadania-temas-conectados-na-Constituicao-e-nos-35-anos-do-STJ.aspx Acesso: 26/04/2025.

Tal afirmação não é sem razão! Se a Educação é um direito fundamental e social, tem o envolvimento de toda a família, da sociedade e do Estado, sendo todos também responsáveis por esse direito, com deveres legais e sociais, ele não pode ficar relegado a abordagem simples nos cursos de Direito, por esse ou aquele professor, estudado com a mera apresentação de um ou outro artigo, nessa ou naquela matéria jurídica, pois isso seria mera transferência exposição de opiniões. Impõe-se assegurar que todos os cursos que objetivam trabalhar na formação do ser humano, integralmente, necessitam ter esse ramo do Direito em suas grades curriculares. O direito à educação impõe a observância do Direito Educacional como ciência, matéria a ser ministrada em todos os cursos ligados à formação do cidadão (professores, pedagogos, psicólogos, assistentes sociais), pois este é, sem nenhuma dúvida, o amparo ao exercício de todos os demais direitos, com consciência plena sobre todos os seus correspondentes deveres e necessita, já, seja ministrado e estudado nas faculdades, por ser ramo específico do Direito, qual seja, o Direito Educacional. Neste Terceiro Milênio, totalmente informatizado, com as distâncias diminuídas pela mídia, judicializar a Educação não é um remédio simples, barato, fácil. Não se pode ficar à mercê do direito de buscar, no Judiciário, a solução para os problemas, pois conhecer e estudar o Direito Educacional tornou-se um dever, para bem desempenhar as funções profissionais, sociais, amparadas na constituição Federal/1988, já que ele é uma ciência e, como tal, todos os envolvidos, alunos, família, escola, sociedade, Estado e os profissionais ligados direta e/ou indiretamente ao exercício desse mister, qual seja, trabalhar na construção de um ser humano cidadão pleno, precisam estar conscientes de seus direitos para melhor cumprirem com seus deveres, evitando, desta forma, que problemas irremediáveis surjam e que o direito à vida, à liberdade sejam plenos, para construir seres humanos para uma convivência saudável, formar cidadãos com caráter, com princípios morais sedimentados no respeito ao próximo, para consolidar, desta forma, uma convivência no bem, ao bom exercício de direitos em consonância com o cumprimento de seus deveres, o que é natural num País democrático, no qual todos têm assegurados seus direitos fundamentais e sociais, in casu, calcados nos princípios da igualdade, da liberdade, do pluralismo de ideias, dentre outros, impressos no art. 206 da CF/88, inerentes a um País livre e democrático.


Matilde Maria Gonçalves de Sá - Membro da Comissão Direito na Escola da OAB/JF.



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